sábado, 7 de julho de 2007

Quinta no vinho

Toda quinta-feira eu, Priscila, Amanda e Carla nos juntamos para tomar vinho e conversar, conversar e conversar. É o típico e clássico clube da Luluzinha. Falamos sobre tudo e principalmente todos. Ninguém escapa de nosso crivo, nem mesmo a postura desafiadora, afirmativa e moderna da Cristina Kirchner que se candidatou à presidência da Argentina. Pena que ela tenha mal gosto para homens, pois convenhamos aquele Nestor é feio. Chegamos também a conclusão que a Argentina só tem que ter mulher no cargo. Olha que tudo, ela vai morar na Casa Rosada. Triste foi constatar os atuais ícones femininos no Brasil. De um lado, a Mônica Veloso sendo a outra e se aproveitando para posar na Playboy e, do outro, a esposa do Renan dando o maior exemplo de submissão. É claro que em meio a todo esses assuntos surgiu a discussão sobre os meus sentimentos diante do Sr. Cláudio. A Priscila, a sempre feminista radical, começou a me criticar por ter pena dele, que isso era afirmar o papel histórico e socialmente construído. A Amanda me defendeu dizendo que era o instinto materno e que não podemos negá-lo pois faz parte de nossa herança genética de milhões de anos. Acho que tem essa postura porque é bióloga e tem uma filha de 10 anos. Ao contrário da Pri que não é mãe e sempre esteve envolvida com movimentos sociais, inclusive é fundadora do Movimento Pró-Mulher. A Carla, a psicóloga da turma, tentou fazer uma análise mais profunda agregando os dois pontos de vistas e chegou a conclusão que tive esse sentimento pois sou apaixonado pelo meu pai, que diga-se de passagem é bem parecido com o Sr. Cláudio em alguns aspectos. Afinal que homem não é parecido? E eu no meio de tudo isso não sendo ouvida. Claro que essa situação se modificou no momento em que dei meu piti básico e pedi para todas ficarem quietas, que estavam falando de mim como se eu não estivesse ali. Depois de alguns segundos de silêncio caímos na gargalhada. E finalmente pude dar meu ponto de vista. Sobre o fato de enxergar no Sr. Cláudio a figura do meu pai não tenho muito o que dizer, nunca fiz nenhuma relação entre os dois, embora a Carla afirme que isso seja inconsciente. Então se é inconsciente não me preocupa, nem Freud conseguiu entendê-lo, porque irei me preocupar com algo incompreensível e cheio de significados que apenas servem para atrapalhar. Quero entender a situação ali, no carne e osso, na minha mais plena consciência. Acredito que inconsciente é um nome para explicar o que não entendemos, mas que no fundo não explica nada, só especula e piora ainda mais a situação. Sobre o fato do instinto maternal até me convence um pouco, mas como não sou mãe ainda fica algo meio sem sentido. A Amanda disse que é exatamente por isso, como não sou mãe tento sublimar esse sentimento com os outros. Achei essa idéia um absurdo, pois seria muito estúpida em escolher o Sr. Cláudio como filho para sublimar meu instinto materno. A Amanda tentou contornar a situação dizendo que não é uma escolha, é algo “inconsciente”. Ela até fez com os dedos o sinal de aspas quando disse inconsciente. Todas nós fuzilamos ela com o olhar e no mesmo momento ela fez um sinal de quem concordou, mas não ficou convencida. Caímos na risada, exceto ela que não gostou muito. Continuei explicando que eu até identifico esse instinto e por isso se torna algo consciente e, portanto, não escolheria o Sr. Cláudio como suposto filho. A Carla delirou com minha explicação e a Amanda deu sinais de discordar novamente, mas foi interrompida pela Pri que disse para ouvir minha opinião e respeitar minha posição. Por fim, disse que o sentimento que mais me incomodou foi exatamente de se sentir impotente diante da situação, pois no dia anterior meu plano estava todo arquitetado e estava preparada emocionalmente para dar prosseguimento a ele. Eu não contava com a fatalidade do Sr. Cláudio ter um infarto. Expliquei que o importante no momento não era o inconsciente, ou o instinto materno ou minha posição social de mulher, mas a minha vida, meus projetos que foram interrompidos e que pouco ou nada podia fazer diante disse, exceto esperar. Meus planos tornaram se gelatina em minhas mãos e escorreu entre meus dedos e quanto mais tento agarrá-los mais eles deslizam, derretem e escapam do meu controle. Ficaram todas em silêncio me ouvindo, quando terminei permanecemos sem palavras por alguns segundos. Abrimos mais uma garrafa de vinho e voltamos a falar de política, do aquecimento global, e claro, de nossos pares.

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